O bruxismo do sono está relacionado ao ronco

O bruxismo do sono está relacionado ao ronco?

O bruxismo do sono está relacionado ao ronco? O bruxismo do sono é um distúrbio caracterizado pelo ranger ou apertar involuntário dos dentes durante o sono. Esse movimento ocorre de forma inconsciente, geralmente durante as fases de sono leve (N1 e N2) e, ocasionalmente, nos microdespertares — breves ativações do sistema nervoso central.

Esse distúrbio é classificado como um movimento estereotipado rítmico e está associado à atividade dos músculos mastigatórios. Apesar de ser comum em até 10% da população adulta, o bruxismo pode ter consequências importantes, como desgaste dentário, dor orofacial, fadiga muscular e disfunção temporomandibular (DTM).

A etiologia é multifatorial, envolvendo aspectos neurológicos, psicológicos e respiratórios, o que explica sua possível associação com outros distúrbios do sono — como o ronco e a apneia obstrutiva.

O que é o ronco e como ele se forma?

O ronco é um som produzido pela vibração dos tecidos das vias aéreas superiores, especialmente o palato mole, a úvula e a base da língua, quando há passagem turbulenta do ar durante o sono.

Durante o sono, os músculos da faringe relaxam naturalmente. Em algumas pessoas, esse relaxamento é excessivo, o que estreita as vias aéreas e aumenta a resistência à passagem do ar. O resultado é a vibração tecidual que causa o som do ronco.

O ronco isolado pode ser benigno, mas, em muitos casos, é um sinal precoce de apneia obstrutiva do sono (AOS) — um distúrbio respiratório mais grave que causa interrupções repetidas na respiração.

Como o bruxismo do sono e o ronco podem estar relacionados?

Nos últimos anos, estudos têm mostrado que o bruxismo e o ronco compartilham mecanismos fisiológicos e gatilhos semelhantes.
Em muitos casos, o bruxismo surge como resposta a uma obstrução respiratória transitória, funcionando como uma tentativa do organismo de restabelecer a passagem de ar.

Durante um episódio de microdespertar induzido pela hipoxemia (queda de oxigênio), o cérebro ativa brevemente o sistema nervoso simpático, aumentando o tônus muscular e a atividade mastigatória. Essa resposta pode provocar o ranger dos dentes, seguido de uma breve melhora da ventilação.

Assim, o bruxismo pode ser entendido como um reflexo protetor em indivíduos com obstruções respiratórias parciais, sendo comum em pessoas que roncam ou apresentam apneia leve.

Um estudo publicado no Journal of Clinical Sleep Medicine (2019) observou que até 40% dos pacientes com bruxismo do sono também apresentavam ronco ou apneia obstrutiva, reforçando a correlação entre os dois distúrbios.

O que acontece no corpo durante a apneia obstrutiva do sono?

Para entender a conexão entre bruxismo e ronco, é essencial compreender a fisiologia da apneia obstrutiva.

Durante o sono, especialmente na fase REM, ocorre um relaxamento acentuado dos músculos da orofaringe. Em indivíduos predispostos — por excesso de peso, anatomia craniofacial estreita ou hipertrofia de amígdalas —, essa perda de tônus pode provocar colapso parcial ou total das vias aéreas.

Quando o fluxo de ar é interrompido, há:

  1. Hipóxia (queda de oxigênio no sangue);
  2. Aumento do CO₂ (hipercapnia);
  3. Ativação do sistema nervoso simpático, elevando a frequência cardíaca e a pressão arterial;
  4. Microdespertar, para restabelecer a respiração.

Esses ciclos de interrupção e despertar se repetem diversas vezes por hora, fragmentando o sono e levando a fadiga diurna, cefaleia matinal e déficit cognitivo.
Esse mesmo mecanismo de microdespertar com aumento de tônus muscular está envolvido na gênese do bruxismo.

O bruxismo pode ser uma resposta à apneia e ao ronco?

Sim. Pesquisas recentes sugerem que o bruxismo, em alguns casos, pode atuar como mecanismo compensatório frente às dificuldades respiratórias noturnas.

Durante um episódio de apneia, a redução de oxigênio estimula o tronco cerebral a enviar sinais motores para restaurar o fluxo aéreo. Esses sinais podem atingir também os músculos mastigatórios, resultando no ranger de dentes.

Essa hipótese é reforçada por estudos de polissonografia que demonstram que o bruxismo tende a ocorrer logo após eventos de apneia e hipopneia, com aumento concomitante da atividade eletromiográfica dos músculos masseteres.

Contudo, nem todo bruxismo está associado à apneia. Existem casos puramente psicogênicos — relacionados a estresse, ansiedade e uso de substâncias estimulantes, como cafeína e nicotina.

O ronco e o bruxismo têm fatores de risco semelhantes?

Sim. Ambos compartilham fatores predisponentes anatômicos, comportamentais e neurológicos, o que explica por que frequentemente ocorrem juntos.

Entre os principais fatores estão:

  • Obesidade (aumenta a obstrução das vias aéreas);
  • Retrognatismo (mandíbula recuada, que reduz o espaço faríngeo);
  • Respiração bucal crônica;
  • Estresse e ansiedade;
  • Uso de álcool e relaxantes musculares antes de dormir;
  • Tabagismo e refluxo gastroesofágico.

Esses elementos alteram o tônus muscular das vias aéreas e da mandíbula, favorecendo tanto o ronco quanto o bruxismo.

O bruxismo pode agravar o ronco ou a apneia?

Embora o bruxismo possa, em alguns casos, ajudar a restaurar a passagem de ar, ele também pode ampliar o desconforto respiratório.

Durante o ranger de dentes, ocorre elevação da pressão intratorácica e contração dos músculos cervicais, o que pode aumentar a resistência das vias aéreas.
Além disso, o bruxismo intenso pode provocar microdespertares adicionais, contribuindo para sono fragmentado e aumento da atividade simpática noturna.

Portanto, quando não controlado, o bruxismo pode agravar sintomas de fadiga, cefaleia e tensão muscular, já comuns em quem sofre de apneia ou ronco intenso.

Quais são os efeitos cardiovasculares desses distúrbios combinados?

Tanto o ronco quanto a apneia — e, em menor grau, o bruxismo — têm efeitos sistêmicos sobre o sistema cardiovascular.

Durante os episódios de apneia, há flutuações repetidas na oxigenação sanguínea e ativação simpática que levam a hipertensão noturna, arritmias e inflamação vascular.

O bruxismo, por sua vez, está associado a descargas de catecolaminas e aumento transitório da frequência cardíaca durante o sono.
Essa hiperativação simpática noturna pode agravar a sobrecarga cardiovascular em indivíduos com apneia, contribuindo para aumento do risco de hipertensão e doenças cardíacas.

Estudos da American Academy of Sleep Medicine (AASM) mostram que pacientes com bruxismo e apneia têm maior variabilidade da pressão arterial e frequência cardíaca, sugerindo sinergia negativa entre os distúrbios.

Como é feito o diagnóstico do bruxismo e do ronco?

O diagnóstico exige uma abordagem multidisciplinar, envolvendo odontologia, otorrinolaringologia e medicina do sono.

Bruxismo

É identificado por meio de:

  • Avaliação clínica odontológica, observando desgaste dentário e sintomas musculares;
  • Eletromiografia de superfície, que mede a atividade dos músculos mastigatórios;
  • Polissonografia, que confirma episódios de bruxismo relacionados ao sono e sua associação com despertares.

Ronco e apneia

São avaliados com:

  • Polissonografia noturna, o exame padrão-ouro que mede fluxo de ar, saturação de oxigênio e esforço respiratório;
  • Exames de imagem das vias aéreas superiores;
  • Análise de índice de apneia-hipopneia (IAH) para determinar a gravidade do distúrbio.

Esses exames permitem distinguir ronco simples, apneia leve e bruxismo secundário a eventos respiratórios.

Quais são as abordagens terapêuticas mais eficazes?

O tratamento deve ser individualizado e abordar tanto a causa primária quanto os fatores associados.

Bruxismo

  • Placas oclusais personalizadas para proteger os dentes e reduzir sobrecarga muscular;
  • Fisioterapia orofacial e técnicas de relaxamento;
  • Controle do estresse e higiene do sono;
  • Dispositivos intraorais de avanço mandibular, em casos associados à apneia.

Ronco e apneia

  • Terapia com CPAP (pressão positiva contínua nas vias aéreas);
  • Aparelhos intraorais de avanço mandibular, que ampliam o espaço das vias aéreas;
  • Tratamento do sobrepeso e redução do consumo de álcool e sedativos;
  • Cirurgias otorrinolaringológicas, quando há obstruções anatômicas.

O uso combinado de aparelho intraoral pode ser especialmente útil em pacientes que apresentam bruxismo e apneia leve a moderada, pois estabiliza a mandíbula e melhora a ventilação noturna.

O que dizem as evidências científicas mais recentes?

Diversos estudos têm reforçado a correlação entre bruxismo, ronco e apneia:

Essas evidências indicam que o bruxismo pode ser tanto um marcador secundário de distúrbios respiratórios quanto um fator agravante do sono fragmentado, reforçando a importância de um diagnóstico preciso.

Perguntas Frequentes (FAQ)

O bruxismo causa o ronco?

Não diretamente, mas ambos podem compartilhar causas comuns, como obstruções respiratórias e estresse.

Todo paciente com bruxismo tem apneia?

Não. Porém, é comum que o bruxismo esteja associado a episódios leves de apneia ou microdespertares respiratórios.

O tratamento da apneia pode reduzir o bruxismo?

Sim. Estudos mostram que o uso de CPAP ou aparelhos intraorais melhora significativamente os episódios de bruxismo relacionados à apneia.

O estresse pode piorar tanto o bruxismo quanto o ronco?

Sim. O estresse aumenta o tônus muscular e o risco de microdespertares, intensificando ambos os distúrbios.

A polissonografia é necessária em todos os casos?

Sim, é o exame mais indicado para confirmar a presença e a interação entre os dois distúrbios

Conclusão

O bruxismo do sono e o ronco não são apenas problemas isolados — em muitos casos, eles compartilham mecanismos fisiológicos e consequências sistêmicas.
Enquanto o bruxismo pode atuar como resposta protetora à obstrução respiratória, ele também pode agravar a fragmentação do sono e sobrecarregar o sistema cardiovascular.

Compreender essa interação é essencial para um tratamento eficaz, que deve envolver diagnóstico preciso, acompanhamento multidisciplinar e controle dos fatores de risco.
Ao cuidar da respiração e da saúde oral, o paciente não apenas dorme melhor, mas também protege o coração, o cérebro e a qualidade de vida.

Referências

American Academy of Sleep Medicine. International Classification of Sleep Disorders (ICSD-3). 2014.

Lavigne GJ, et al. Sleep bruxism and sleep-disordered breathing: Review and integration. J Clin Sleep Med. 2019. PubMed

Ohayon MM, et al. Prevalence and comorbidity of bruxism and sleep disorders. Sleep. 2017. PubMed

Sjöholm TT, et al. Effects of CPAP treatment on sleep bruxism. Chest. 2020. PubMed

Somers VK, et al. Sleep Apnea and Cardiovascular Disease. Circulation. 2008. PubMed

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Dr Paulo Coelho

Dr. Paulo Coelho é graduado em Odontologia e Psicanálise, com especialização em Ortodontia, DTM e Dor Orofacial. Possui Mestrado em Ortodontia e Doutorado em Psicanálise, com foco em Distúrbios do Sono e Odontologia do Sono.
Atua de forma integrada no tratamento do ronco, da apneia do sono e das disfunções orofaciais, unindo ciência e abordagem humanizada para promover saúde, bem-estar e qualidade de vida.

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